oLhA a HoRa!!!

Quem sou eu

Minha foto
¯`*·.¸¸♥ღ°Quem é essa que me olha de tão longe, com olhos que foram meus?(Retrato antigo - Helena Kolody) ¯`*·.¸¸♥ღ° Quem é essa que me vê do lado de lá quando eu dela preciso cá? Quem é essa que está em mim e eu nela em hora sem fim? Quem é essa, quem sou eu?De tanta pressa o vento a levou...Fiquei eu Olho no olho O meu no seu Num retrato antigo Num estar comigo Num olhar só meu. (Janice Persuhn)¯`*·.¸¸♥ღ° De retralho em retalho tiram pedaços de mim de espaço a espaço costuram os vazios de mim de palavra a palavra descobrem eu sou mesmo assim. (Autópsia) ¯`*·.¸¸♥

PrOfeSsOrA WiLma NuNeS RaNgEl

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terça-feira, 30 de julho de 2013

Pequeno dicionário Amoroso

CRÔNICA de Zé Beto Maciel.
 

Não. Eu tenho que ficar quieto no meu canto. Se lembrar muito, eu choro. É inapelável. O que fazer, então? Sempre as mesmas perguntas. E sempre esta exaustiva apreensão. Um torpor. Hoje, mais uma vez, vi uma das fotos de um lugar que povoou minha infância. Era da Igreja Presbiteriana. Algo próximo, bem perto da minha casa. Todos os dias, passava pela frente da igreja rumo ao açougue do Mallorquin, do paraguaio, como falávamos. Um quilo de agulha ou paleta, carne com osso para o almoço de segunda à sexta. Sábado, limpava a casa e domingo cedo, ia comprar uma galinha viva no João Galinheiro, outro paraguaio, na altura do Macaranã. As ruas, com exceção da Avenida Brasil, eram de terra vermelha e o Arroio Monjolo serpenteava o centro. Tudo era uma aventura.
ilha de Ipacaraí
Minha casa na rua Bandeirantes, depois Major Raul de Mattos – um militar morto no combate ao contrabando nas barrancas do Rio Paraná – e finalmente Juscelino Kubistchek, ou JK. Na quadra entre as ruas Rui Barbosa e Bartolomeu de Gusmão, poucos resistiram até hoje.
Pioneiro: Lucio Alves pinto 
 Minha mãe é um das últimas junto com a dona Vidalha e seu Rolon. Seu Jorge e dona Negra, os Pilatti, seo João e dona Rosa, dona Cecília, os Abatte Soley, dona Pichi, os Paganotto, os Pereira – todos se foram. Não resta quase mais ninguém na minha rua que era cortada por uma valetão que seguia até a Quintino Bocaiúva e desaguava no Monjolo. Jacarés, saracuras e chicórias eram comuns no leito formado pelo óleo e água de lavagem dos postos Shell e Atlantic – os dois únicos da Avenida Brasil.
Lembrei de novo da igreja. Foi demolida nos 90 e virou estacionamento. Também demoliram a Agência de Rendas, a cadeia pública e outra série de pequenos prédios, casas e outros patrimônios históricos. A casa em que nasci ainda resiste, aos pedaços. Cresci nesse espaço, num terreno amplo, cheio de frutas da estação, de pés descalços e com um calção que minha própria mãe fazia.

Meu mundo era grande. Jogava bolita, bulico e coral, tive tosse comprida e quase morri quando derramei leite quente na minha barriga. Passei um bom tempo com pomadas e ungüentos enrolado em pano e em folhas de bananeira. No terreno de casa se plantava milho, criava-se galinhas e porcos. Toda estação da primavera a frente se floria de marçanilha que junto com hortelã, marcela, quebra-pedra, malva, brotos de laranja e de goiaba, mais leite magnésia formavam a farmácia básica da minha família. Chá de hortelã com leite magnésia, então era meu favorito para dores de barriga e outros espasmos.
Tempos atrás, chamei meu filho e pedi para anotar, quantas tipos de frutas tinha no terreiro de casa. Passou de 30. Laranjas, mandarinas, uvas, guavirovas, maçãs, peras, goiabas, abacates, pitangas, figos, mangas, ameixas, pêssegos, mamões, limas. Minha família tinha dois programas típicos. Invariavelmente, a cada mês, íamos catar marcela – uma flor amarela de cheiro forte e muito boa para estômago – nas barrancas do Rio Paraná. A outra, era uma vez por ano, com toalhas de mesa, íamos no goiabal, atrás de onde hoje está o TTU. Minha mãe fazia o doce de goiaba, descartando as sementes, e usando a polpa carnuda, cozinhando com água e açúcar. Era a chimia que se comia com as galhetas que eu comprava também a uma quadra de casa, na Panificadora Progresso.
A minha infância teve ainda setra, mais conhecida como estilingue, pandorga e uma infinidade de pequenos e grandes bichos, pássaros, insetos, cães, gatos, cigarras e até um tatu-bola. As aranhas eram enormes, da palma da mão, buçanos e mandorovás se ocupavam das folhas das hortas e das frutas, queimavam a pele. O contato com os animais – jaguaras, guaipecas, tucanos, papagaios, galinhas e gatos – nos dava amor, carinho, sarna, pulgas, cobreiros, bernes, furúnculos e piques. Não façam isso em casa, mas a sarna se combatia com um bom banho de sabão e Miticoçan no corpo molhado. Todo corpo, literalmente, ardia em chamas. Era o remédio. O pique se extrai com agulha ou faca e se punha cinza quente no buraco do pé. Outro remédio doído era para pisão no prego. Só melhorava quando se esquentava umas duas ou três rodelas de cebola e se aplicava no ferimento. Tiro, queda e muito dor na hora. Berne e furúnculos também se tiravam com toucinho quente. Eu nunca os tive. Eu tive catapora.
Éramos felizes. Embora minha memória seja cada vez mais seletiva não posso deixar de lembrar da gastronomia de casa. Ainda gosto muito de reviro, da chipa, do bori-bori, costela de porco com mandioca, mas não comia a sopa paraguaia porque é um prato que tem cebola. Chipa-guazu, tortilha e locro, conheci depois de grande e também gosto muito. A comida forte paraguaia tem uma explicação. Era um desejum da manhã. Porque geralmente se comia e se enfrentava o trabalho na roça, no qual se precisava de muita energia. Do reviro, diz a lenda que foi invenção dos soldados paraguaios na guerra com o Brasil. No campo da batalha só se tinha farinha de trigo e banha de porco. Mais água e para o reviro, foi um passo.
Meus pais tomavam chimarrão, o mate, e tererê. O chimarrão minha mãe tomava com as comadres. Dona Pichi deixava o charuto pendurado no portão de casa e Dona Negra tinha uma criação de Tôfraco, a galinha de Angola. Meu pai eu, gostávamos de tererê, o mate paraguaio, sempre gelado e com raízes. Refrescante. Algumas comadres, minha mãe chamava de nha manhera – algo como aquela qualquer. Aliás, a mãe era mestre numa infinidade de jopara, a mistura do guarani e português. Nandejara era outra expressão para se referir às partes intimas das minhas irmãs. A minha família tinha uma lista extensa de verbetes, de joparas, exclusivos e únicos.
Em casa, a expectativa do ano inteiro era com as festas de final de ano. Era um mês de festa entre o dia 15 de dezembro e 15 de janeiro. Nessa época, matava-se qualquer quantidade de galinhas, um porco grande e se bebia guaraná da Antarctica. Do porco, tinha a carne, a banha, o torresmo e chouriço de sangue. Era uma festa. Mais gente em casa, galinha assada, galinha ao molho, macarronada e bolo feito pela Dona Carlota. O aniversário de casamento dos meus pais era também no dia 25 de dezembro. O bolo era de dois andares, branco, cobertura de um glacê cristalizado e recheio de doce de ameixa, doce de coco. Era uma delícia.
Não lembro muito de presentes de Natal, nem dos aniversários. Lembro das festas. Um único presente que lembro, meu pai me deu uma régua de desenhos e minha irmã me tomou. Até hoje tiro onda dela com isso. Mesmo assim, como a minha mãe me classificava, eu era o ganjento, o chorão. Filho do meio, entre seis, o mais doente, o mais isso e mais aquilo. Nem sabe ela o quanto isso perdurou na vida de um rebelde tardio.
A minha cidade, eu tinha como um mapa na palma da minha mão. Desde as idas ao açougue, à panificadora, aos passeios da família aos domingos, a descoberta da escola, primeiro a Escola Jorge Schimmelpfeng, mais conhecida como Centro, e depois o Bartolomeu Mitre. Era uma fantástica viagem por muitos caminhos possíveis até escola. Por vezes passava pelas jaguatiricas presas no pátio da Polícia Federal (atual Provopar), me fascinava com os cartazes do Cine Star, estranhava seu Inácio Batista, mascando não sei o que sem os dentes na boca, e das tentativas de roubar alguma revista no Fumante.
Era uma expiação da vida e quando a cerração chegava sentia-me como um semideus correndo de braços abertos, bafejando meu hálito na espessa neblina. Não enxergava um palmo na frente, mas me via entre nuvens, num paraíso, como poucos entenderiam. Nem os gritos de mocorongo, piá gadeiudo e jacu me incomodavam. Estava eu lá, na mais pura abstração.
Algumas palavras
Bolita Cerração Reviro Setra Ganjento Pandorga Tererê Galheta Tôfraco Manhera Chipa Chipá guazu Retovado Yvaporoitî Tortilha Nambrena Bodoque Locro Mbeyu Mandorova Buçano Guavirova Mandarina Manguruju Mandi Bori-bori Piá Gadeia Cururu Cuia Guaipeca Mocorongo Catapora Jaguara Lambari Pamonha Pixaim Jacu
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Zé Beto Maciel é jornalista em Curitiba

Crônica de um amigo...alma próxima...e a distância ...corpo longe...eu no Oeste, ele no Leste da cidade cinza. Beto...encontrei essa relíquia no site da Guatá...precisei ilustrá-la com a sua ou a minha cara...rsrs! Não sei se "infloi ou contribói" com a rede...mas prefiro continuar sendo a Wilminha "pescadora de ilusoes" Saudades sempre meu amigo!

EsToU: Em Foz 
PtD: wilma de outrora com a de amanhã às 06 horas

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