Bomba versus Lama
Texto 1
Uma
das coisas mais tristes que o ser humano acaba fazendo diante de
grandes tragédias é a relativização de tragédias.
Eu
me lembro que quando eu era criança, eu via notícias
de crianças passando fome na チfrica
e um ou outro adulto dizia: “Ahhh, mas aqui no Brasil tem um monte
de criança passando fome e ninguém faz nada” - uma das coisas
mais imbecis que já escutei,
por uma série de razões:
Primeiro,
porque lá na ?frica,
onde aquelas crianças passavam fome,
elas eram encurraladas por países em GUERRA, elas eram vítimas de
uma violência desmedida, em países paupérrimos (e acreditem, não
é um superlativo exagerado, não), onde a classe média de lá, é o
miserável daqui.
Segundo,
porque se existem crianças aqui, em um país riquíssimo e farto em
recursos naturais - é sinal que somos muuuuitoooo egoístas ou
existe alguma coisa muuuuitoooooo errada na forma de se administrar o
país, não é mesmo? Passar fome, no Brasil é como dizer “tem
gente passando sede, na beira do Rio Amazonas”. Jamais,
isso deveria acontecer.
Dizer
que não devemos nos preocupar com crianças africanas passando fome
na ?frica
porque aqui também existem crianças passando fome, é carimbar o
nosso atestado de incompetência e a nossa carteirinha de
insensibilidade humana.
Gente
assim também pensa:
“pra que me importar com crianças passando fome no Nordeste, se
aqui no meu Estado também têm.” e depois: “pra que me importar
com crianças passando fome no meu Estado, se aqui no meu bairro,
também têm”…até chegar ao ponto de dizer “pra que ajudar
alguém, se ninguém me ajuda?”.
Quando
relativizamos tudo, o resultado final é esse. Sempre esse: o egoísmo
puro e absoluto, do individualismo humano.
O
meu é melhor que o seu. O meu é pior que o seu. Sempre.
E
no mais, senhores - fome é FOME. Não interessa onde seja,
com quem seja. Fome, é uma das dores mais absurdas que o ser humano
pode sentir, e só quem já sentiu isso
alguma vez na vida - como eu - entende, como isso é.
Hoje,
a coisa não mudou muito não. Vejo uma tragédia imensa como essa
acontecendo em Paris, um ódio infinito disseminando mortes violentas
a esmo, por conta de um radicalismo extremo religioso e acreditem,
existem pessoas censurando o nosso direito de nos sensibilizarmos com
a tragédia francesa, apenas porque uma outra grande tragédia
aconteceu aqui - no Brasil - na pequena cidade de Mariana, em Minas
Gerais, há poucos dias.
“Ficam
aí falando de Paris, mas Mariana que é bom…” (suspiro)
(...)
Mas
tragédias como a de Mariana e de Paris poderiam ter
sido evitadas. Isso sim, é o que dói mais, nos dois casos.
Mariana,
pela negligência continuada, ano após ano. Paris, pela insanidade
religiosa, estudada, planejada e programada.
Ambas,
tragédias provocadas pela ação do ser humano. Ambas, evitáveis.
Ambas, provocando dor, comoção e sofrimento, para muitos. (
Fábio Márcio, Jornal MS Diário, 16/11/15, Blog Só Atividades)
Texto 2
A inveja é uma mérde - Fábio Marchi
Apesar de sermos um país “abençoado”, somos um povo invejoso.
Não é a inveja pelo que não
temos, mas pelo que não somos. E acreditem, somos tão invejosos, ao
ponto de invejarmos a atenção dispensada, pela tragédia alheia - o que
causa muita preocupação: pois quando o povo de um país, passa a sentir
INVEJA de todo o rebuliço causado no resto do Mundo, por conta de uma
tragédia acontecida em OUTRO país - é porque chegamos ao fim do poço, no
quesito “vencer na vida” (na verdade, já passamos desse fim, cavando um
belo buraco).
[...]
Só para se ter uma noção do
quanto somos diferentes, algumas horas depois dos atentados na França, o
presidente pessoalmente estava lá, andando sobre escombros e
conversando com as vítimas. Aqui, nossa Presidenta fez um sobrevôo de
helicóptero, em Mariana. Não andou de barquinho, não colocou o pé na
lama.
Lá, o Governo Francês combate
com veemência as ações terroristas. Aqui, o Governo Brasileiro apóia a
imigração de jihadistas - ou seja, os extremistas islâmicos que defendem
matar qualquer um que seja “infiel”, pela sua “guerra santa” (onde em
sua cultura, mulher não manda porcaria alguma, e jamais será Presidente
de algo). Podem vir bombardear aqui, que somos o povo mais legal e
acolhedor do Mundo, viu?
[...]
É claro, não vou dizer que o
brasileiro não tenha bom coração. É claro que temos - e garanto que a
maioria da nossa população, em sua imensa maioria (na verdade, a
esperança é essa), tenha boa índole e se preocupe, de verdade, com as
tragédias alheias, tanto aqui, como acolá.
Mas é que aqui, nós sabemos que
as coisas são diferentes. Principalmente, porque alguém vai passar a
perna, na sua boa fé e na sua vontade, em ajudar.
(...)
Nós não acreditamos em nós
mesmos. E não fazemos o menor esforço, para que isso mude. Admiramos e
temos condolência com a tragédia alheia, porque no fundo, sabemos que
lá, as coisas funcionam de verdade.
[...]
Entendam: não é descaso. É admissão, do nosso fracasso social.
Ainda tem dúvidas? Então vou
dar dois exemplos clássicos, duas tragédias que, há décadas - atormentam
a população de tal jeito - que já nos tornamos relativamente
insensíveis a elas, em algum nível:
Seca no Nordeste e deslizamentos de terra, no litoral Sudeste/Sul.
Sim, elas existem, e são
tragédias humanas - mas o resto do povo se importa cada vez menos, a
cada ano que passa (quem recebe doações, sabe exatamente do que estou
falando).
A primeira é uma tragédia
lenta, gradativa e não sensibiliza a mídia - são pessoas pobres, não são
consumidores dos produtos dos anunciantes (boa parte desses locais, nem
TV têm) e portanto, não merecem muito interesse pelos órgãos de
comunicação locais - quiçá, os nacionais. A segunda, por ser uma
tragédia sazonal - de época marcada - gera mídia, mas causa estresse no
resto da população: afinal, se sabem que isso vai acontecer DE NOVO,
porquê não fazem nada? [...]
E por quê não resolvem?
Resposta simples: ambas são motes eleitorais e ajudam muito os políticos
a se elegerem ou reelegerem-se. A promessa de uma vida melhor e
diferente ainda é o melhor cabo eleitoral. Ademais, no Brasil, tragédias
infinitas, sem solução, continuadas e persistentes - são uma excelente
fábrica de dinheiro. Nosso dinheiro.
Sendo assim, antes de você
reclamar que alguém mudou a foto do perfil nas redes sociais pelas cores
da bandeira francesa (porque as redes sociais conseguiram se mobilizar
para isso, mais rapidamente do que uma votação de reality show ), dê o
exemplo! Mostre que você é o brasileiro ou a brasileira, que fez a
diferença!
Mostre o que você já fez pela
cidade de Mariana, por exemplo. Mostre a doação que você já fez, seja em
dinheiro, comida ou água. Foi lá trabalhar como voluntário(a)? Mostre o
quanto você tem moral para cobrar algo, além de reclamar muito, nas
redes sociais. Mostre pelo menos a petição virtual que você assinou,
pedindo justiça- antes de vociferar que “a gente não liga para as
nossas tragédias”.
Todos ligamos, amigos. Só não acreditamos mais na resolução delas.
Como mostrar para o Mundo que
merecemos atenção e solidariedade para as nossas tragédias, se nós
mesmos não levamos a sério, as NOSSAS tragédias? [...]
E você ainda vai ficar de
mimimi, por causa de amigos que mudaram seu avatar nas cores da França,
no FEICE, através de um sistema que o próprio Facebook criou e
disponibilizou, através de UM CLIQUE ??? Então convença Mark Zuckerberg
para que, na nossa próxima grande tragédia brasileira, ele se comova e
assim, disponibilize uma ferramenta semelhante para nós, ok? Aí sim,
vai ficar tudo legal, tudo em casa!
Afinal de contas, só assim - e só isso, um avatar - demonstraria o nosso respeito pelas nossas tragédias, né?
PS: Esse texto, é mais para
quem não entendeu meu OUTRO texto, aqui. Se você entendeu, parabéns -
vai ganhar um croissant! Virtual, é claro.
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